Classificações, terminologias e ontologias NO CAMPO DA saúde

 

Maria Cristiane Barbosa Galvão [1]

Universidade de São Paulo

mgalvao@usp.br

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Resumo

Considerando problemas ocorridos no cenário brasileiro durante a pandemia de Covid-19, buscou-se apresentar as funcionalidades básicas de classificações, terminologias e ontologias empregadas no campo da saúde, a fim de responder as seguintes questões: Qual escopo cobrem e para que são usadas? Quais são seus elementos constituintes? Quais são seus contextos de uso? Quais profissionais as empregam? Para atingir esse objetivo e responder tais questões, desenvolveu-se um estudo descritivo a partir de documentos oficiais dessas linguagens. Descreveu-se a Systematized Nomenclature of Medicine Clinical Terms (SNOMED CT); a Logical Observation Identifiers Names and Codes (LOINC); a Classificação Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID); a Classificação Internacional de Atenção Primária (CIAP); a Tabela de Procedimentos do Sistema Único de Saúde; a Classificação Brasileira Hierarquizada de Procedimentos Médicos (CBHPM); a Terminologia Unificada da Saúde Suplementar (TUSS); a Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF); a NANDA International Nursing Diagnoses: definitions and classification (NANDA-I); a Classificação Internacional da Prática de Enfermagem (CIPE); e os Descritores em Ciências da Saúde (DeCS). Ressalta-se que as classificações, terminologias e ontologias do campo da saúde são desenvolvidas por instituições de referência internacional e nacional. Elas apresentam escopos bem delimitados a serem empregados em situações comunicacionais bem estabelecidas seja por equipes disciplinares seja por equipes interdisciplinares. Para evitar qualquer tipo de desvio no emprego das classificações, terminologias e ontologias do campo da saúde, é fundamental que os estudantes, profissionais, gestores e pesquisadores do campo da saúde recebam formação e treinamento continuado sobre essas temáticas.

Palavras-chave: Terminologia. Classificação. Ontologia. Saúde. Brasil.

CLASSIFICATIONS, TERMINOLOGIES AND ONTOLOGIES IN HEALTH FIELD

 

Abstract

Considering issues that occurred in the Brazilian scenario during the Covid-19 pandemic, this research aimed to present the basic functionalities of classifications, terminologies and ontologies used in the health field, seeking to answer the following questions: What scope do they cover and what are they used for? What are their constituent elements? What are their contexts of use? Which professionals employ them? To achieve this goal and answer such questions, a descriptive study was developed. The analysis comprised: the Systematized Nomenclature of Medicine Clinical Terms (SNOMED CT); Digital Imaging and Communications in Medicine (DICOM); the Logical Observation Identifiers Names and Codes (LOINC); the International Classification of Diseases and Related Health Problems (ICD); the International Classification of Primary Care (CIAP); the Table of Procedures of the Unified Health System; the Brazilian Hierarchical Classification of Medical Procedures (CBHPM); the Unified Terminology of Supplementary Health (TUSS); the International Classification of Functioning, Disability and Health (ICF); the NANDA International Nursing Diagnoses: definitions and classification (NANDA-I); the International Classification of Nursing Practice (ICNP); and, the Health Sciences Descriptors (DeCS/MeSH). It is noteworthy that the classifications, terminologies and ontologies in the field of health are developed by international and national reference institutions. They have well-defined scopes to be used in well-established communication situations, whether by disciplinary or interdisciplinary teams. In order to avoid any type of deviation, it is essential that students, professionals, managers and researchers in the field of health receive education and continued training on these themes.

Keywords: Terminology. Classification. Ontology. Health. Brazil.

1  INTRODUÇÃO

No segundo semestre de 2021, os noticiários brasileiros publicaram uma série de denúncias relacionadas a uma operadora de plano de saúde que alterou os códigos da Classificação Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID) registrados em prontuário de pacientes com Covid-19 a fim de, supostamente, camuflar os dados estatísticos e ocultar a real causa morte a ser registrada em certidões de óbito dos referidos pacientes. Com essas denúncias, muitas dúvidas foram lançadas nos meios de comunicação sobre o emprego das classificações e terminologias em saúde (ALVES; LARA, 2021).

A partir desse cenário brasileiro, este artigo teve por objetivo apresentar as funcionalidades básicas de classificações, terminologias e ontologias em saúde costumeiramente empregadas no campo da saúde, buscando responder as seguintes questões: Qual escopo cobrem e para que são usadas? Quais são seus elementos constituintes? Quais são seus contextos de uso? Quais profissionais a empregam? Para atingir esse objetivo e responder tais questões, desenvolveu-se um estudo descritivo a partir de documentos oficiais de instituições responsáveis pelo desenvolvimento e atualização dessas linguagens.

Como critério de inclusão e exclusão das terminologias, classificações e ontologias a serem analisadas, considerou-se, primeiramente, a Portaria nº 2.073, publicada pelo Ministério da Saúde no Brasil, em 31 de agosto de 2011, que regulamenta o uso de padrões de interoperabilidade e informação em saúde para sistemas de informação em saúde no âmbito do Sistema Único de Saúde, nos níveis Municipal, Distrital, Estadual e Federal, e para os sistemas privados e do setor de saúde suplementar (BRASIL, 2011). Nesta Portaria, recomenda-se o emprego das seguintes terminologias, classificações e ontologias: Systematized Nomenclature of Medicine Clinical Terms (SNOMED CT); Logical Observation Identifiers Names and Codes (LOINC); Classificação Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID); Classificação Internacional de Atenção Primária (CIAP); Tabela de Procedimentos do Sistema Único de Saúde; Classificação Brasileira Hierarquizada de Procedimentos Médicos (CBHPM); e Terminologia Unificada da Saúde Suplementar (TUSS).

Complementarmente, embora não citado pela Portaria nº 2.073. incluiu-se nessa análise: a Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF); a NANDA International Nursing Diagnoses: definitions and classification (NANDA-I); a Classificação Internacional da Prática de Enfermagem (CIPE); e, a título de diferenciação entre contexto clínico e acadêmico, considerou-se a inclusão dos Descritores em Ciências da Saúde (DeCS). Tal opção deriva da relevância dessas terminologias e classificações no cenário nacional e internacional.

2  Systematized Nomenclature of Medicine Clinical Terms (SNOMED CT)

Estabelecida em 1999, a Systematized Nomenclature of Medicine Clinical Terms (SNOMED CT) é uma ontologia computacional em saúde mantida pela Organização Internacional para o Desenvolvimento de Normas de Terminologia em Saúde (IHTSDO). Atualmente, a SNOMED CT é a ontologia em saúde mais abrangente do mundo. Seu conteúdo encontra-se dividido em hierarquias que compreendem: achados clínicos; procedimentos; entidades observáveis; estruturas corporais; organismos; substâncias; produtos farmacêuticos/biológicos; espécimes; conceitos especiais; objetos físicos; forças físicas; eventos; ambientes e localizações geográficas; contextos sociais; situações com contexto explícito; estágios e escalas; relações conceituais; qualificadores de valor; artefatos de registro. Além da organização hierárquica, a SNOMED CT traz termos relacionados como agentes causadores e processos patológicos, ou seja, conexões complexas entre termos. Importante notar que cada termo da SNOMED CT possui um identificador único.

A SNOMED CT também tem trabalhado para se integrar e incorporar terminologias e classificações existentes, como a CID, visando o aproveitamento de dados clínicos já codificados internacionalmente. É o início de um futuro onde as diferentes terminologias estarão integradas sob a mesma plataforma e compartilharão formas de construção, estruturação, divulgação e atualização, facilitando a integração e interoperabilidade dos dados, informações e conhecimentos em saúde.

Atualmente, pode-se afirmar que a SNOMED CT é direcionada para o desenvolvimento de e uso em prontuários e registros eletrônicos em saúde, permitindo a padronização de praticamente todos os conteúdos existentes no contexto da saúde. No entanto, sua aplicação no contexto brasileiro é limitada dada a ausência de versão em língua portuguesa.

A SNOMED CT é continuamente atualizada e suas versões são disponibilizadas em seu navegador disponível em: https://browser.ihtsdotools.org/. É importante destacar que os países podem adicionar às suas versões nacionais conteúdos específicos que não estão na versão principal e internacional da SNOMED CT, sem com isso afetar o conteúdo e o compartilhamento de dados internacionalmente. No sítio da SNOMED CT, disponível em https://www.snomed.org/, estão vários recursos informacionais de referência para o seu estudo.

3  Logical Observation Identifiers, Names, and Codes (LOINC)

Criado em 1994, o Logical Observation Identifiers, Names, and Codes (LOINC) fornece um sistema de codificação universal para relatórios de laboratório, laudos e outras observações clínicas visando intercâmbios de dados e informações entre diferentes sistemas informatizados. O LOINC abarca a totalidade do que se possa testar, medir ou observar sobre um paciente, abrangendo os contextos laboratoriais e clínicos. No que se refere a laboratório, compreende tudo relacionado a uma amostra: química, hematologia, sorologia, microbiologia (incluindo parasitologia e virologia), toxicologia; bem como categorias para contagem de células, suscetibilidades a antibióticos etc. Já a parte clínica engloba tudo que se possa testar, medir ou observar sobre um paciente sem remover uma amostra dele, incluindo: sinais vitais, hemodinâmica, entrada/saída, eletrocardiograma, ultrassom obstétrico, ecocardiograma, imagens urológicas, procedimentos gastroendoscópicos, gerenciamento de ventilação pulmonar, estudos de radiologia, documentos clínicos, instrumentos de pesquisa selecionados (por exemplo, Escala de Coma Glasgow, escala de depressão PHQ-9, instrumentos de avaliação do paciente exigidos pelo CMS) e outras observações clínicas.

O LOINC emprega códigos numéricos e toda a sua estrutura está disponível para consulta via navegador ou via acessos aos seus diferentes arquivos. Para realizar a consulta em seu navegador, é necessário o registro individual, que inclui nome, email e instituição no endereço: https://search.loinc.org/searchLOINC/. Recursos informacionais sobre o LOINC estão disponíveis em: https://loinc.org/learn/recommended-readings/ e https://loinc.org/. A equipe desenvolvedora da SNOMED CT e a equipe do LOINC realizam trabalhos em parceria para a integração dos conteúdos dessas linguagens.

4  Classificação Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID)

A Classificação Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID) é uma ferramenta terminológica de caráter classificatório desenvolvida pela Organização Mundial de Saúde (OMS), que apresenta classes e subclasses de doenças, condições relacionadas à saúde e causas externas de doença ou morte. Tem por objetivo permitir o registro, análise, interpretação e comparação sistemática de dados de mortalidade e morbidade coletados em diferentes países ou áreas e em momentos diferentes. Com seus 150 anos de vida, a CID é uma classificação de diagnóstico, empregada por 115 países, para todos os propósitos epidemiológicos gerais e muitos propósitos de gerenciamento de saúde. Incluem-se aqui a análise da situação geral de saúde de grupos populacionais, o monitoramento da incidência e prevalência de doenças e outros agravos à saúde, sendo adequada para estudos de aspectos financeiros de um sistema de saúde, como faturamento ou alocação de recursos.

São usuários da CID profissionais da saúde, pesquisadores, profissionais de gerenciamento de informações de saúde, codificadores, trabalhadores de tecnologia da informação de saúde, analistas, formuladores de políticas, seguradoras, organizações de pacientes e empresas públicas e privadas.

A CID emprega um código alfanumérico padronizado que representa uma condição ou problema relacionado à saúde. Para usar a CID é importante saber em qual classe se encontra o termo, visto que alguns termos podem estar subordinados a diferentes classes. Em outras palavras, para usar a CID é necessário ter acesso ao seu conteúdo em completude e ler suas notas explicativas na íntegra a fim de que cada codificação atribuída a um paciente esteja o mais adequada possível. Especialmente, na edição da edição 11ª. da CID, é preciso se atentar às notas explicativas, visto que ela passa a adotar a pós-coordenação entre suas classes, conforme detalhado por Galvão e Ricarte (2011).

A OMS disponibiliza várias versões da CID online que podem ser consultadas por meio de navegadores na Web. São recursos informacionais de referência para o estudo da CID e em constante atualização:

·         World Health Organization. International Statistical Classification of Diseases and Related Health Problems (ICD). Disponível em: https://www.who.int/standards/classifications/classification-of-diseases. Acesso em: 23 set. 2021.

·         World Health Organization. ICD-11 Reference Guide. Disponível em: https://icd.who.int/icd11refguide/en/index.html. Acesso em: 23 set. 2021.

·         World Health Organization. Browser ICD-11. Disponível em: https://icd.who.int/browse11/l-m/en. Acesso em: 23 set. 2021.

·         World Health Organization. Browser ICD-10. Disponível em: https://icd.who.int/browse10/2019/en Acesso em: 23 set. 2021.

5  Classificação Internacional de Atenção Primária (CIAP)

A atenção primária à saúde é caracterizada por um conjunto de ações de saúde, no âmbito individual e coletivo, que abrange a promoção e a proteção da saúde, a prevenção de agravos, o diagnóstico, o tratamento, a reabilitação, a redução de danos e a manutenção da saúde com o objetivo de desenvolver uma atenção integral que impacte positivamente na situação de saúde das coletividades. Entende-se que quando um paciente é atendido no contexto da atenção primária, nem sempre possui uma doença. Assim, associar ao paciente um diagnóstico por meio da CID nem sempre é possível ou apropriado. Além disso, muitos sintomas e condições não-patológicas presentes na atenção primária são difíceis de codificar com a CID, que em princípio foi projetada para estatísticas de mortalidade e morbidade com uma estrutura baseada em doenças.

Por tais razões, a Classificação Internacional de Atenção Primária (CIAP) permite fazer os registros padronizados da consulta na atenção primária considerando inclusive a perspectiva do paciente sobre sua saúde.

Desenvolvida pelo Comitê de Classificação Internacional da Organização Mundial de Médicos de Família, a CIAP é um instrumento terminológico de caráter classificatório que apresenta classes e subclasses relacionadas à atenção primária, incluindo: queixas e sintomas; procedimentos diagnósticos e preventivos; medicações, tratamentos e procedimentos terapêuticos; resultados de exames; processos administrativos; acompanhamento e outros motivos de consulta; problemas sociais etc. Entre seus usuários estão médicos de família, clínicos gerais e equipes de atenção primária.

A CIAP emprega códigos alfabéticos e códigos numéricos que podem ser combinados para formar códigos alfanuméricos. Um ponto relevante da CIAP é que ela apresenta um mapeamento de seus códigos com potenciais códigos da CID, visando agilizar o trabalho dos profissionais de saúde que precisam codificar o mesmo caso pelas duas classificações. Evidentemente, este recurso não substitui a consulta da CID, pois sempre é importante ler as notas explicativas das classificações para se ter a certeza que o seu uso será adequado.

Assim como outros instrumentos terminológicos, a CIAP é constantemente atualizada e, em dezembro de 2020, foi lançada a sua 3a versão, que está disponível online. São recursos informacionais relevantes para a compreensão da CIAP:

·         World Health Organization. International Classification of Primary Care, 2nd edition (ICPC-2). Disponível em: https://www.who.int/standards/classifications/other-classifications/international-classification-of-primary-care. Acesso em: 23 set. 2021.

·         World Organization of Family Doctors’ International Classification Committee. International Classification of Primary Care; 3rd Revision. Disponível em: https://www.icpc-3.info/. Acesso em: 23 set. 2021.

·         World Organization of Family Doctors. International Classification of Primary Care. Disponível em: https://www.globalfamilydoctor.com/site/DefaultSite/filesystem/documents/Groups/WICC/International%20Classification%20of%20Primary%20Care%20Dec16.pdf. Acesso em: 23 set. 2021.

·         World Organization of National Colleges, Academies, and Academic Associations of General PractitionersFamily Physicians. Classificação Internacional de Atenção Primária (CIAP 2). 2. ed. Florianópolis : Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade, 2009. Disponível em: http://www.sbmfc.org.br/wp-content/uploads/media/file/CIAP%202/CIAP%20Brasil_atualizado.pdf. Acesso em: 23 set. 2021.

6  Tabela de Procedimentos, Medicamentos, Órteses, Próteses e Materiais Especiais do Sistema Único de Saúde

A Tabela de Procedimentos, Medicamentos, Órteses, Próteses e Materiais Especiais do Sistema Único de Saúde, desenvolvida pelo Ministério da Saúde do Brasil, desde 2007, e também conhecida pelo título Tabela de Procedimentos do SUS, reúne os procedimentos disponibilizados à população brasileira (BRASIL, 2007), entre os quais se encontram: ações de promoção e prevenção em saúde; procedimentos com finalidade diagnóstica; procedimentos clínicos; procedimentos cirúrgicos; transplante de órgãos, tecidos e células; medicamentos; órteses e próteses e materiais especiais; e ações complementares da atenção à saúde. Esta Tabela é uma terminologia complexa que traz um rico detalhamento de informações como: situações em que um procedimento pode ser aplicado; perfil de idade e sexo que pode receber um determinado procedimento; perfil dos profissionais que podem realizar cada procedimento; custos envolvidos em cada procedimento; tempo estimado de recuperação do paciente após cada procedimento; mapeamento entre procedimentos e os códigos CID; histórico de vigência cada procedimento no SUS.

Esta Tabela é empregada na gestão do SUS, auxiliando o processo de tomada de decisões no âmbito financeiro e até mesmo auxiliando auditorias relacionadas à aplicação dos recursos. Sua atualização ocorre mensalmente, momento em que novos procedimentos a serem oferecidos pelo SUS são incluídos em seu conteúdo e procedimentos que não serão mais cobertos pelo SUS são excluídos, podendo ainda trazer na atualização a revisão de valores e competências dos procedimentos.

A Tabela está disponível online, por meio do Sistema de Gerenciamento da Tabela de Procedimentos, Medicamentos, Órteses, Próteses e Materiais Especiais do SUS, em: http://sigtap.DATASUS.gov.br/tabela-unificada/app/sec/inicio.jsp, onde se pode pesquisar os procedimentos contemplados na Tabela e demais informações relacionadas a cada procedimento. Um recurso informacional adicional sobre esta Tabela é sua Wiki, disponível em: https://wiki.saude.gov.br/sigtap/index.php/P%C3%A1gina_principal.

7  Classificação Brasileira Hierarquizada de Procedimentos Médicos (CBHPM)

A Classificação Brasileira Hierarquizada de Procedimentos Médicos (CBHPM) é desenvolvida pela Associação Médica Brasileira (AMB), em parceria com o Conselho Federal de Medicina (CFM) e a Federação Nacional dos Médicos (FENAM), sendo adotada como padrão dos procedimentos médicos para o Sistema de Saúde Suplementar, incluindo a remuneração a ser obtida em cada procedimento. A CBHPM abarca: procedimentos gerais; procedimentos clínicos ambulatoriais e hospitalares; procedimentos cirúrgicos e invasivos; bem como procedimentos diagnósticos e terapêuticos. Esta classificação é utilizada por profissionais de saúde, gestores, operadoras de planos de saúde e também por pacientes. Trata-se de um instrumento terminológico em constante atualização, cuja última edição foi lançada em 2020. A aquisição da CBHPM pode ser realizada no site da AMB, na página: https://amb.org.br/cbhpm/. Nessa mesma página, encontram-se as últimas resoluções normativas e comunicados relacionados à inclusão de novos procedimentos, alterações em portes e subportes, correções e revisões.

A CBHPM além dos procedimentos traz seus portes e subportes que são contabilizados de acordo com a Unidade de Custo Operacional (UCO), que considera a depreciação de equipamentos, manutenção, mobiliário, imóvel, aluguéis, folha de pagamento e outras despesas comprovadamente associadas aos procedimentos médicos.

Embora haja algumas versões da CBHPM disponíveis na web, é recomendável que as unidades de saúde, os profissionais de saúde e as operadoras de planos de saúde empreguem, a edição mais atual dessa classificação. O uso de diferentes versões de uma classificação sempre traz problemas para a interoperabilidade de dados e informações.

A título de exemplificação, uma versão mais antiga da CBHPM encontra-se em:

·         Cardoso Filho, Florentino de Araújo; Zilli, Emílio Cesar. Classificação Brasileira Hierarquizada de Procedimentos Médicos. São Paulo: Associação Médica Brasileira, 2012. Disponível em: https://sbacvsp.com.br/Procedimentos/Tabela-CBHPM-Geral.pdf. Acesso em: 23 set. 2021.

8  Terminologia Unificada da Saúde Suplementar (TUSS)

A Terminologia Unificada da Saúde Suplementar (TUSS) derivou de uma proposta da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), órgão que regulamenta os prestadores de planos de saúde no Brasil. Esta terminologia visa facilitar a troca de informações e dados na saúde suplementar, entre prestadores de serviços, operadoras de planos de saúde e beneficiários, abarcando procedimentos, serviços de diagnóstico e terapia, gases medicinais, materiais, órteses, próteses, materiais especiais (OPME) e medicamentos (BRASIL, 2012).

Em uma perspectiva terminológica e de organização da informação, o acesso à TUSS é limitado e as informações sobre seu uso e aplicação são fragmentadas em pdfs, arquivos em formato zip e arquivos Excel disponibilizados por diferentes instituições e empresas de saúde. Exemplos dessa realidade podem ser encontrados em:

·         Tabela TUSS Procedimentos Médicos: padrão Unimed. Disponível em: https://www.unimed.coop.br/web/itajuba/noticias/tabela-tuss-procedimentos-medicos-padrao-unimed?doAsGroupId=1195627&refererPlid=1195635&controlPanelCategory=current_site.content Acesso em: 23 set. 2021.

·         Agência Nacional de Saúde Suplementar. ANS publica nova versão do Padrão TISS: fevereiro/2021. Disponível em: ns.gov.br/planos-de-saude-e-operadoras/espaco-da-operadora/avisos-para-operadoras/6220-ans-publica-nova-versao-do-padrao-tiss-fevereiro-2021. Acesso em: 23 set. 2021.

9  Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF)

A Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF), desenvolvida pela OMS, é um instrumento terminológico para a descrição da saúde e dos estados relacionados à saúde, incluindo conteúdos que ajudam a descrever as mudanças nas funções e estrutura do corpo, o que uma pessoa com uma condição de saúde pode fazer em um ambiente padrão (seu nível de capacidade), bem como o que realmente faz em seu ambiente usual (seu nível de desempenho). Esses domínios são classificados do ponto de vista corporal, individual e social por meio de duas listas: uma lista de funções e estrutura do corpo e uma lista de domínios de atividade e participação.

Na CIF, o termo funcionalidade refere-se a todas as funções, atividades e participação do corpo, enquanto deficiência é igualmente um termo abrangente para deficiências, limitações de atividades e restrições de participação. A CIF também lista os fatores ambientais que interagem com todos esses componentes.

Essa Classificação pode ser usada para vários fins, sendo uma ferramenta de planejamento e política para os tomadores de decisão. Ela enfatiza a saúde e a funcionalidade, e não a deficiência, reconhecendo assim que todo ser humano pode experimentar uma diminuição nas condições de saúde e, portanto, experimentar algum tipo de deficiência conforme ocorre o desenvolvimento da vida. Assim, esse processo de mudança nas condições de saúde é entendido como uma experiência humana universal.

Dentre tantas formas de uso, a CIF possibilita coletar dados vitais de uma maneira consistente e internacionalmente comparável, abrangendo funções do corpo tais como: funções mentais, funções sensoriais e dor, funções de voz e fala, funções dos sistemas cardiovascular, hematológico, imunológico e respiratório, funções do aparelho digestivo, metabólico, endócrino, funções geniturinárias e reprodutivas, funções neuromusculoesqueléticas e relacionadas ao movimento, funções da pele e estruturas afins. Abrange ainda as estruturas do corpo como: estruturas dos sistemas nervoso, o olho, ouvido e afins, estruturas envolvidas na voz e na fala, estruturas dos sistemas cardiovascular, imunológico e respiratório, estruturas relacionadas aos sistemas digestivo, metabólico e endócrino, estruturas relacionadas aos sistemas geniturinário e reprodutivo, estruturas relacionadas ao movimento, pele e afins.

Contém ainda atividades e participação em atividades, tais como: aprendizagem e aplicação de conhecimentos, tarefas e demandas gerais, comunicação, mobilidade, autocuidados, vida doméstica, interações e relacionamentos interpessoais, principais áreas de vida, comunidade, vida social e cívica, produtos e tecnologias, ambiente natural e mudanças feitas pelo homem no ambiente, suporte e relacionamentos, atitudes, serviços, sistemas e políticas.

Empregando-se a CIF é possível estabelecer a magnitude ou gravidade da condição e funcionalidade, associando-se aos códigos principais os qualificadores: 0 Não há problema (nenhum, ausente, insignificante); 1 Problema leve (leve, pequeno); 2 Problema moderado (médio, regular); 3 Problema grave (grande, extremo); 4 Problema completo (total); 8 não especificado; 9 não aplicável (ORGANIZAÇÃO, 2013).

Como as demais terminologias internacionais, a CIF disponibiliza um navegador para consulta, disponível em: https://apps.who.int/classifications/icfbrowser/. Outros recursos informacionais sobre essa Classificação podem ser encontrados em:

·         World Health Organization. International Classification of Functioning, Disability and Health. Disponível em: https://www.who.int/standards/classifications/international-classification-of-functioning-disability-and-health. Acesso em: 23 set. 2021.

10        NANDA International Nursing Diagnoses: definitions and classification (NANDA-I)

NANDA International Nursing Diagnoses: definitions and classification (NANDA-I) é uma terminologia internacional, disponível em mais de 20 idiomas, incluindo a língua portuguesa, que auxilia enfermeiros de todo o mundo a descrever, definir e fornecer indicadores para condições tratadas e diagnosticadas no contexto da enfermagem. Esta terminologia é atualizada frequentemente, tendo sido a última versão em inglês lançada em 2021. Além da atualização constante, a terminologia NANDA-I é baseada em evidências científicas, sendo sua validação intercultural realizada por enfermeiros de todos os continentes. Assim, cada termo que a integra possui um estudo aprofundado que o embasa e é resultante de consensos científicos internacionais, permitindo que os enfermeiros estabeleçam diagnósticos mais precisos e padronizados. Além de termos e suas definições, ela abarca os indicadores para o estabelecimento do diagnóstico e referências bibliográficas de apoio. Por suas características, a NANDA-I pode ser empregada em sistemas informatizados como os prontuários eletrônicos de pacientes e nos demais sistemas de apoio à decisão de enfermagem (NANDA, 2018). Alguns recursos informacionais sobre a NANDA-I estão disponíveis em: https://nanda.org/.

11        Classificação Internacional da Prática de Enfermagem (CIPE)

A Classificação Internacional da Prática de Enfermagem (CIPE) é uma terminologia desenvolvida pelo Conselho Internacional de Enfermeiros, abordando a sistematização da assistência de enfermagem, o processo de enfermagem e a metodologia da assistência de enfermagem prestada a indivíduos, famílias e comunidades em diversos cenários.

A CIPE fornece aos profissionais de enfermagem soluções de conteúdo para os registros eletrônicos de saúde em todos os níveis. Seu uso proporciona a coleta, o armazenamento e a análise de dados de enfermagem de forma padronizada, gerando dados para melhorar a prática, a administração, a educação e a pesquisa em enfermagem e permite trazer visibilidade e reconhecimento às atividades realizadas pelos profissionais de enfermagem.

Assim como outros instrumentos terminológicos, a CIPE é constantemente atualizada. Em sintonia com as iniciativas internacionais que buscam harmonizar as diferentes terminologias existentes no campo da saúde, existe uma mobilização, em andamento, para mapeamento da CIPE com a SNOMED CT.

Recursos informacionais sobre a CIPE podem ser encontrados em:

·         International Council of Nurses. eHealth & ICNP™. Disponível em: https://www.icn.ch/what-we-do/projects/ehealth-icnptm Acesso em: 23 set. 2021.

·         International Council of Nurses. ICNP Browser. Disponível em: https://www.icn.ch/what-we-do/projects/ehealth-icnptm Acesso em: 23 set. 2021.

12        Descritores em Ciências da Saúde (DeCS)

Os Descritores em Ciências da Saúde (DeCS) constituem um vocabulário estruturado e multilíngue, disponível em português, inglês, espanhol e francês, cujo objetivo é ser usado para a indexação de artigos de revistas científicas, livros, anais de congressos, relatórios técnicos, teses e dissertações, e outros documentos, assim como para ser usado na pesquisa e recuperação da literatura científica em bases de dados bibliográficas como as Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), LILACS, MEDLINE e outras.

Embora não seja uma terminologia clínica, o DeCS pode ser usado em algumas situações de sistemas clínicos para fazer uma integração com a literatura especializada e evidências científicas. Porém, é preciso ter cautela, pois o DeCS não substitui as terminologias clínicas citadas ao longo desse texto, por ser muito genérico. Logo, esse tipo de integração deve ser muito bem planejada. Por exemplo, em um sistema de prontuários eletrônicos de saúde pode haver um link para o DeCS para que o profissional de saúde encontre textos científicos relacionados a uma determinada condição de saúde de um paciente. De igual modo, pode-se criar em sistemas de informação em saúde mais inteligentes uma conexão entre termos das terminologias clínicas e os descritores do DeCS para facilitar a busca por evidências científicas sobre determinadas condições de saúde. Essa visão de integrar sistemas tem sido vislumbrada já há muitos anos como forma de economizar o tempo dos profissionais de saúde que precisam buscar informações e evidências durante, por exemplo, um atendimento clínico.

O DeCS é desenvolvido e atualizado pelo Centro Latino-Americano e do Caribe de Informação em Ciências da Saúde, também conhecido pelo nome original Biblioteca Regional de Medicina (BIREME). A origem do DeCS se filia ao Medical Subject Headings (MeSH), por sua vez desenvolvido e atualizado pela U.S. National Library of Medicine (NLM).

O DeCS é atualizado anualmente, incluindo descritores relacionados à saúde pública, homeopatia, ciência e saúde, e vigilância sanitária. O navegador e demais recursos informacionais sobre o DeCS podem ser encontrados em: https://decs.bvsalud.org/.

13        Discussão

As classificações, terminologias e ontologias do campo da saúde são desenvolvidas por instituições de referência internacionais e nacionais. Elas apresentam escopos bem delimitados a serem empregados em situações comunicacionais bem estabelecidas seja por equipe disciplinares seja por equipes interdisciplinares. Todas essas linguagens de especialidade visam a transparência no registro dos dados e informações em saúde, bem como buscam viabilizar a produção do conhecimento clínico e científico. Essas linguagens foram desenvolvidas também para garantir a comparabilidade dos dados em cenários locais, regionais, nacionais e internacionais. A adulteração de codificações em registros de pacientes foge a toda a razão de ser das classificações, terminologias e ontologias em saúde e não possuem um embasamento razoável de sustentação clínica ou científica. Para evitar qualquer tipo de desvio no emprego das classificações, terminologias e ontologias do campo da saúde é fundamental que os estudantes, profissionais, gestores, pesquisadores do campo da saúde recebam formação e treinamento continuado sobre essas temáticas (BOEIRA; DAL MOLIN; BALTAZAR, 2020).

Finalmente, para os pesquisadores da Ciência da Terminologia, da Ciência da Informação e da Ciência da Computação, que estudam processos de representação e organização da informação, é importante esclarecer que este estudo teve uma limitação proposital de não buscar estabelecer diferenças conceituais/estruturais entre as classificações, terminologias e ontologias em saúde analisadas. Esta opção teórica decorre do fato de grande parte dessas linguagens estar evoluindo tecnologicamente para se tornar cada vez mais completas e robustas, distanciando-se de suas estruturas históricas iniciais. A título de exemplo, as classificações internacionais da saúde, em seus estágios atuais, comportam tanto relações hierárquicas quanto relações ontológicas, associativas e linguísticas, relações estas explicadas por Cintra et al. (1994), próprias das ontologias, bem como trazem várias explicitações conceituais próprias das terminologias clássicas. Já as ontologias em saúde, por sua vez, têm realizados esforços para incorporar todas as demais linguagens existentes. Certamente, esse atual cenário de confluências entre linguagens de especialidade no campo da saúde está um pouco distante dos estudos mais clássicos que estabelecem diferenças mais expressivas entre classificações, terminologias e ontologias. Por outro lado, ressalta-se que no cenário nacional ainda há terminologias em estágio incipiente de desenvolvimento, como a TUSS, que precisarão de mais tempo e investimento para alcançar o patamar tecnológico das terminologias internacionais.

REFERÊNCIAS

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BOEIRA, Suzana; DAL MOLIN, Rossano Sartoni; BALTAZAR, Ecleia Mota. Educação permanente para a qualificação do processo de enfermagem com o uso de terminologia padronizada de enfermagem. IN: DAL MOLIN, Rossano Sartori. Enfermagem: inovação, tecnologia e educação em saúde. [S.l.]: Editora Científica Digital, 2020. Disponível em:  https://downloads.editoracientifica.org/articles/200800806.pdf  Acesso em: 23 set. 2021

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[1] Professora Doutora da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo.